O semblante daquele
ascensorista me parecia familiar.
Ao tomar o elevador
para chegar até ao mirante do Metropolitan Hotel em Teresina, na cobertura do
prédio, cumprimentou-me apertando minha mão e foi logo dizendo: - como pvai?
Tfuudo buem com pfocê? Respondi que sim e indaguei: - e com você? Então ele
respondeu: pfapaz, eu nem te conto... agfora, tfou maizçoumenos. - Mas isso é uma longa história, disse-me
sorrindo.
A intimidade dele para
comigo, deixou-me intrigado. Rebusquei na memória para ver se se conseguia
lembrar alguém do meu tempo de estudante em Teresina, e nada...
Finalmente o elevador
chegou ao destino e ao nos despedirmos, ele esboçando a dificuldade em
pronunciar as palavras disse: - Guaxela vem aqui depois, que te conto como
aconteceu tudo isso.
Ao pronunciar o meu
apelido do tempo em que estudei em Teresina, não tive mais dúvidas. Era um dos colegas de ginásio, mas eu jamais poderia
imaginar que tratava-se do Oziel, o galã da Rua da Estrela, hoje Desembargador
Freitas, que nos tempos da jovem guarda, nas tertúlias no Clube dos Diários, trajando calça boca de
sino, camisas listradas e botas canos longo, ganhava todas as meninas da festa.
Era apelidado de o “Roberto Carlos dos Pobres”.
Meu apelido “Guaxela”
surgiu na primeira aula de português com o nosso professor Raldir Bastos.
Iniciando a primeira série do ginásio no Colégio Demóstenes Avelino. Nosso professor
de Português, Raldir Bastos, entrevista
cada um dos alunos perguntando a sua procedência. Ao chegar minha vez disse-lhe
que era de Tutóia, do estado do Maranhão… Professor Raldir exclamou: “então meu
filho, você é da terra dos guaxinins”!
A turma toda caiu na
gargalhada e foi quando surgiu este meu apelido. Fiquei tão familiarizado com o tal apelido
que se alguém me chamasse por Antonio eu dificilmente atenderia, mas Guaxela ou
Guaxinim, eu já estava a postos.
Fiquei curioso, e ao
mesmo tempo ansioso, para conhecer a história e descobrir quem era esse amigo,
tanto que no dia seguinte retornei, pois
era sábado, e queria reencontrar umas “amigas”
que costumavam frequentar o bar e restaurante no mirante do Hotel, de onde, durante a noite,
tem-se uma visão maravilhosa de
Teresina.
Oziel aproximou-se da
mesa onde eu já estava degustando uma “loura
suada” com petisco de camarão empanado, cumprimentou-me e com aquela voz
embaralhada e às vezes sibilante, disse-me quem ele era, e que imaginava eu não
o tê-lo reconhecido de imediato. Confirmei que sim e fui logo perguntando: o que
foi que lhe aconteceu, meu irmão?
Queria saber como um
cara boa pinta, bem afeiçoado, “bom de papo”, metido a galã, estava com uma
deformação enorme no rosto - a bochecha do lado esquerdo inchada, muito mais do
que a do Kiko, personagem da série Chaves da TV mexicana. Era como se tivessem
implantado um caroço de pequi (muito
usado pelos barbeiros de antigamente) em sua bochecha.
-
Isssso é uma longa hissstória. Maisss lhe digo, pfoi o prfeto 17,
respondeu-me.
Quando ele falou em
preto 17, pensei ter sido algum chapeado,
estivador das imediações do Palha de Arroz, que o teria agredido violentamente
até causar aquele estrago em seu rosto, e que, certamente, para ele, um galã
dos anos 1970, seria um grande trauma.
Contou-me que ao
terminar os estudos básicos em Teresina, fora para o Rio de Janeiro, onde uma
prima prometera lhe arranjar um emprego num dos cinemas do Largo do Machado que
à época lá funcionavam. E assim foi feito. Trabalhou inicialmente no cinema da
Metro e depois arranjou outros empregos e por fim numa concessionária de
automóveis onde tinha um salário fixo e mais a comissão pelas vendas de carro e
de consórcios. Inicialmente morou no
bairro da Glória, nas Ruas Hermenegildo de Barros e Cândido Mendes, vizinho até
da ladeira do Russel, onde se localizava a Rádio Globo. Casou-se com essa prima
e foram então morar em outro bairro.
Tudo ia bem em sua
vida. Harmonia com a esposa, esperança de terem filhos, apesar de já com quase
dois anos de casados nenhum rebento ainda ter dado o ar da graça ou avisado que
viria... Enfim, tudo ia na santa paz de Deus, até que uma casa de jogos, um
cassino, foi instalado próximo a sua
residência.
Diariamente ao sair do trabalho Oziel passava no tal cassino para ficar “curiando”. E o croupier dando as ordens em diversos idiomas: “façam jogo senhores”! “Make your bets gentlemen”! “hagan juego señores”! e o resultado era sempre o mesmo: preto 17!
Falou que durante a semana, todos os dias, ficava observando o movimento das apostas e com vontade de fazer uma “fezinha” mas, receoso de perder seu dinheiro, não se aventurava, até que um dia, segundo ele, diante dos insistentes resultados preto17, criou coragem, se arriscou e jogou todo o salário que tinha recebido no final do mês. E sabe qual foi o resultado? – perguntou-me ele, o que prontamente respondi: deu preto 17.
- Dzegativo, respondeu. Dzeu pfoi pfvermelho pvinte sete.- Sim, disse-lhe, e o que tem isso a ver com o defeito em seu rosto?
Foi então que ele explicou: ao chegar em casa, completamente liso, sem dinheiro, sem compras do supermercado, e ainda por cima com uma desculpa esfarrapada, a esposa embraveceu e aplicou-lhe tremendo chute nos testículos, que um dos ditos foi esbarrar na bochecha esquerda, causando-lhe aquele estrago facial. Agucei mais ainda minha curiosidade e perguntei-lhe: - e o outro? Ele, balançando a cabeça negativamente respondeu-me: - Guaxela, essse não psei onde pfoi parar…
Falou que durante a semana, todos os dias, ficava observando o movimento das apostas e com vontade de fazer uma “fezinha” mas, receoso de perder seu dinheiro, não se aventurava, até que um dia, segundo ele, diante dos insistentes resultados preto17, criou coragem, se arriscou e jogou todo o salário que tinha recebido no final do mês. E sabe qual foi o resultado? – perguntou-me ele, o que prontamente respondi: deu preto 17.
Foi então que ele explicou: ao chegar em casa, completamente liso, sem dinheiro, sem compras do supermercado, e ainda por cima com uma desculpa esfarrapada, a esposa embraveceu e aplicou-lhe tremendo chute nos testículos, que um dos ditos foi esbarrar na bochecha esquerda, causando-lhe aquele estrago facial. Agucei mais ainda minha curiosidade e perguntei-lhe: - e o outro? Ele, balançando a cabeça negativamente respondeu-me: - Guaxela, essse não psei onde pfoi parar…
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