Por Altevir Esteves *
Um grupo de amigos amantes de passeios e corridas em trilhas saiu para mais um evento. Desta vez a organização prometia um percurso muito bonito, mas com alguns trechos difíceis de se transpor. Eram veredas, pedras e buracos profundos, com passagens juntas a penhascos. Eles gostam disso.
Animados, se puseram a caminho. Num determinado lugar a estrada foi ficando apertada, até se transformar apenas numa trilha, por onde andavam caçadores e caças. Adiante, um declive tortuoso, com teto de galhos baixos, obrigando os aventureiros a andarem curvados. Deveriam se preparar porque logo chegariam na parte mais difícil. Uma parte do grupo se assustou com a notícia. Mais difícil que aquilo não poderia ser, não dava. Então recuaram até a última bifurcação, quando se abria outra estradinha, se não própria para carros, mas que permitia andarem mais confortáveis. O guia ensinou que poderiam ir por ali, que chegariam no mesmo lugar, mas iriam se arrepender. Não os convenceu.
No ponto de encontro, após uma jornada demorada, as conversas fluíram nos grupos: os que seguiram pelas veredas e os que foram pela estrada. Mas as conversas não se afinavam entre os dois. Pareciam papos diferentes. E eram mesmo. Mais tarde, quando começaram a postar as fotografias de seus aparelhos celulares no grupo social, as interrogações e exclamações ficaram ainda maiores. Aqueles que foram pela estrada lamentavam não ter visto lugares tão bonitos enquanto os outros se deleitavam pelo esforço recompensado.
Vivemos procurando nos desviar do caminho. Para tudo há métodos, processos, meios de alcançar algo, chegar em algum lugar. Podem chamar de atalho, variante, rodeios, macetes, o que for. Mas quando se tenta seguir pelo caminho mais fácil, mais curto, menos sofrido, perdemos o melhor da experiência, que é o aprendizado. Queremos aquilo que tem mais valor econômico, maior status, o nível mais alto e tudo em menor tempo possível, investindo menos. Procuramos atalhos e perdemos a boa imagem, o detalhe importante, a marca dos que por ali passaram, os registros sublimes que somente os olhos do observador sensível conseguem enxergar.
Nos dias de hoje a palavra “variante” está na moda, tudo porque uma nova cepa de um vírus poderoso “surgiu do nada”, como dizem e continua a vitimar milhares de pessoas. Todavia, muitos de nós continua a procurar variantes e atalhos para não seguir as recomendações e assim evitar ou diminuir o contágio. A máscara no queixo e o desleixo com a higiene são contornos encontrados; o falso atestado de comorbidade para obter logo a vacina, assim como pilotar uma moto com o capacete na curva do braço, pronto para ser colocado na cabeça tão logo veja um guarda de trânsito. Atalhos para ter mais conforto, respirar melhor, ganhar tempo, chegar na frente dos outros, ludibriar. Atalhos. Não se fala aqui em seguir roteiros rígidos como os trilhos da linha férrea, mas uma trilha, por onde temos que ir e, se preciso for, desviar de obstáculos, voltando logo em seguida ao percurso programado.
As variantes estão judiando, matando, sepultando sonhos. Se, não daqueles que cortaram caminho, mas dos que não tiveram chance de prosseguir.
O caminho da verdade é único, não cabe desvios, atalhos, variantes. Ou encaramos a verdade, ou perdemos a oportunidade de acertar e de aprender, ficando viciados, estagnados. E no futuro, para ir a algum lugar, apelamos inevitavelmente para novos contornos e o pior, criando novas variantes para outros, igualmente, vacilarem, sofrerem, estagnarem.
É preciso ter coragem, é preciso ser forte, é preciso ser um de nós, do nosso time, o time dos que seguem o caminho. Do contrário, a imensa fila andrajosa de errantes, a dos mortos vivos insepultos, que teimam em não aprender, engrossa e empobrece, pois criam, vivem e morrem no segmento variante.
Altevir Esteves* funcionário aposentado do Banco do Brasil, escritor, poeta, maratonista e membro da Academia Parnaibana de Letras - Cadeira nº 14.
Texto bem escrito, aproveitando o tino desenvolvido do autor,como também a vivência de maratonista. Homem dado às letras, Altevir, com romances bem aceitos pelo público, aproveita as variantes do coronavirus e nos traz belos ensinamentos para o nosso dia. Parabéns, Altevir! Digno do Escritor que você é!
ResponderExcluirWIlton Porto