quinta-feira, 29 de novembro de 2018

AS ARANHOLAS

Por Antonio Gallas

 Início dos anos 1970.  Projeto Rondon desbravando as regiões Norte e Nordeste deste imenso Brasil. Instalado em Paraíba um campus avançado  da Universidade Federal do Espírito Santo muito bem dirigido pelo professor José Domingos que foi diretor a Escola Rolando Jacob (salvo engano o primeiro), mais tarde fazendeiro em Araioses no Maranhão.
O camarão de Tutóia ultrapassa fronteiras e fica conhecido como o “melhor do Brasil’’, tanto assim que, quem visitar a cidade e não saborear este delicioso fruto do mar,  é mesmo que ir à Itália e não saborear suas famosas pizzas napolitanas,  uma bruschetta ou até mesmo  um  carpaccio, prato feito a partir de carne ou de peixe cru, cortado em fatias finas, e é comumente servido como um aperitivo.
Crédito Blog do Pessoa
Nessa época eu estava tentando me estabilizar em Parnaíba como professor de Inglês. Não tínhamos ainda rodovias asfaltadas e o percurso   entre Tutóia e aquela importante cidade do Piauí era feito via marítimo-fluvial nas lancha “Mensageiro de São Francisco”, ‘’ Cidade de Tutóia” ou “Mensageiro de Santo Antonio”.  No percurso faziam três paradas obrigatórias: na Ilha do Igoronhon, em Água Doce e em Carnaubeiras onde as lanchas recebiam grande quantidade de caranguejos para serem comercializados em Parnaíba e até transportados em pequenos caminhões para Fortaleza no Ceará para abastecimento dos restaurantes da cidade.
Numa sexta-feira, com objetivo de passar o fim de semana o meus pais, embarco em Parnaíba numa dessas lanchas com destino a Tutóia.  Embarcaram também cinco universitários pertencentes ao Projeto Rondon. Dois rapazes e três moças.  Os rapazes eram de cor negra, bem acentuada.  As moças de tez parda.  Todos usavam camisas do tipo T-shirt com as inscrições do Projeto Rondon.  Um dos rapazes ostentava uma boina com as cores da Jamaica, tipo aquelas Bob Marley, feitas de tricô, sendo que uma das moças, a que mais tagarelava, parecia conhecer bem a região, pois, durante o trajeto da embarcação, explicava aos demais em detalhes, sobre o percurso, a vegetação, etc. etc...  Dava impressão que já tinha feito aquele trajeto várias vezes.
Puxei conversa com eles e um dos rapazes perguntou- me se eu sabia e um local onde pudessem ficar hospedados e onde saborear o tão famoso camarão de Tutóia de que tanto ouviram falar.
Crédito blog do Antonio Amaral

Indiquei o “Bar do Tito” e a Pousada Embarcação na Praia da Barra. Matariam os dois coelhos de uma só cajadada.
Saímos do Porto Salgado de Paraíba ao meio dia, e como não houve qualquer embaraço durante a viagem, chegamos à rampa do Porto de Tutóia por volta das 17 horas. Cada passageiro desembarcou e tomou seu rumo, seu destino.
Na rampa, ao desembarcarmos em Tutóia, encontro o “chico professor” e peço-lhe para levá-los até lá, na Pousada Embarcação.
Domingo, cumprida a obrigação para com os pais e também para com os amigos, embarco novamente na lancha com destino a Parnaíba pois, segunda-feira pela manhã eu teria reunião na escola qual iria iniciar a lecionar em Parnaíba. 
Como já citei antes, a embarcação faria uma parada em Carnaubeiras, no município de Araioses para receber os caranguejos e transportá-los até a parada final que seria Parnaíba.  Não sei precisar em temos de quilos, nem quantas cordas ali eram embarcadas, mas sei que era uma quantidade suficiente para encher quase que totalmente o porão da referida lancha. 
A moça tagarela ao ver tantos caranguejos sendo colocados no porão da embarcação chamou os colegas e foi logo dizendo: - vejam colegas, quanta aranholas!
E era aranholas pra cá, aranholas pra ali, aranholas pra todo lugar...
Expedito Gonçalves, cabo da Marinha do Brasil, lotado na Capitania dos Portos do Piauí, agência de Tutóia Maranhão, ao ouvir a moça chamar caranguejo de aranhola disse: - ora, uma égua dessa, bem aí da Parnaíba, não sabe que isso é caranguejo? Espera aí que vou já ensinar essa rapariga. Evidentemente que todos conheciam caranguejo, pois os rapazes eram soteropolitanos e duas moças capixabas.
O Expedito foi aquele tipo de pessoa que nasceu pra fazer as outras pessoas rirem. De tudo e de todos ele fazia um piada. E todos, em Tutóia, indistintamente, gostavam dele.
Segurando uma corda de caranguejo e com sua voz de tom grave dirigindo-se ao grupo, e em especial à moça, falou: - “olhe aqui senhorita”. E segurando a pata do crustáceo disse: - “Estão vendo isso aqui que parece uma tesoura? Pois bem. Preste atenção senhorita. Toda mulher tem priquito e todo priquito tem grelo. O grelo funciona como um verdadeiro imã para essas presas aqui. Tenha cuidado senhorita, pois se uma dessas agarrar no seu grelo, vai ser um Deus nos acuda aqui nessa lancha!”
Foi o suficiente para que a moça fosse se trancar no camarote da embarcação e ficasse lá até o fim da viagem.
Na segunda-feira fui à reunião da escola para o início do ano letivo. E qual foi minha surpresa! Lá também estava a moça das aranholas.
Tornamo-nos bom amigos, trabalhamos juntos alguns anos até que ela passou em um concurso federal e despediu-se do magistério.











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