sábado, 20 de fevereiro de 2021

A PRISÃO, O PRESO E OS PRISIONEIROS



Por Altevir Esteves*

    


A viatura policial chegou com uma brecada forte, os pneus se arrastando no cimento, sujando o piso de breu. De cada uma das portas saltou um policial e em cada um deles se via o volume de armas sobre os coletes à prova de balas. Por último saiu um homem bem alto, musculoso e uma cara de poucos amigos, que logo foi amparado por um dos policiais, que o manteve com as mãos para trás e o fez  caminhar em direção ao prédio suntuoso da delegacia.

Repórteres e cinegrafistas, uns com câmaras sobre os ombros, outros com aparelhos celulares levantados acima de seus rostos, todos procuram o melhor ângulo de imagens e alguma palavra da figura aprisionada. No entanto, apenas um sorriso enigmático brotou daquele rosto que parecia ampliado. Não tardou e sua fotografia estampou sítios e perfis nos meios digitais, mostrando-se atrás de grades e dizendo-se vitorioso e que dali sairia em breve, como um grande herói injustiçado, confortando seus seguidores que da rua pediam sua liberdade.

Que crime teria cometido? A quem teria ferido? Estaria arrependido? Pagaria pelos prejuízos causados? Ninguém sabe, nem mesmo o delegado que o interrogou, o jornalista que lhe estendeu o microfone, nem o juiz que de longe lhe encerrou, nem mesmo o seu advogado, que atônito, não tinha explicações.

A prisão ostentava o seu nome, definição e órgão público que lhe administrava. No seu interior centenas de outros detentos descontinuaram suas lutas inglórias pela liberdade e a maioria deles esperava uma oportunidade de fuga coletiva. Poucos aguardavam o cumprimento da pena. 

O preso continuava a sorrir, com a cabeça erguida, ombros largos, eretos, assim como as sobrancelhas, despertas e insones, pois seus atos, acreditava, estavam corretos e justos, segundo seus critérios da moral e da ética.

Lá fora, espalhados pelas calçadas e no canteiro central, prisioneiros jogavam palavras de ordem ao vento, xingamentos, ameaças. Encarcerados da aglutinação ideológica, com as algemas da subjugação velada, sujeitados pelo alinhamento com a inconformidade que ignora preceitos, formas, cultura e ordem social. Fora dos portões e muralhas eletrificadas, estes são os verdadeiros marginais, os prisioneiros que seguem à margem da ordem e seus sentimentos conectados ao juízo e interesses de outros. 

A prisão não aprisiona, mas pretende deter os que ameaçam, que causam danos. O preso há de se sujeitar aos muros e grilhões. O prisioneiro precisa se libertar da ignorância infamante, caminhar com seus próprios pés e seguir o caminho do bom, do justo e do belo. E este conjunto passa, necessariamente, pela sensatez e pela beleza do viver.



Altevir Esteves* escritor, poeta, maratonista e membro da Academia Parnaibana de Letras - Cadeira nº 14.


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