sexta-feira, 11 de setembro de 2020

ESTÓRIAS DA ILHA REBELDE

Antonio Gallas 

...meu bem... meu bem... sou eu amor! abre a porta...

Foto google meramente ilustrativa 

Em meados dos anos 1960 quando fazia o ginásio em Teresina, primeiro no antigo Colégio Demóstenes onde fiz o exame de admissão e cursei a primeira série, depois no Colégio Estadual Zacarias de Góes,  2ª e 3ª séries, meus pais decidiram transferir-me para São Luís, a fim de que eu desse continuidade aos   meus estudos. Talvez, pela possibilidade de, estando eu  na capital maranhense, eles poderem manter comigo um diálogo mais  frequente, através de correspondências, tendo em vista o fluxo de pessoas de Tutóia que diariamente se deslocavam para São Luís nos diversos voos que as empresas Certa Táxi Aéreo (comandante William) Cobra Táxi Aéreo (comandante Olivar Weber) Táxi Aéreo Aliança (comandante Galdêncio) Taxi Aéreo Vitória (comandante Tabalipa) e outras companhias de táxi aéreos mantinham  àquela época   entre a capital e cidades do interior.

O colégio Demóstenes   Avelino localizado na praça Demóstenes Avelino, hoje conhecida como Praça do Fripisa, não mais existe, enquanto que o Zacarias de Góes, o Liceu Piauiense, continua exuberante na Praça Landri sales (Praça do Liceu) – um marco histórico na educação piauiense por ter sido a primeira escola pública criada no Piauí, ainda no tempo do império.

Ao chegar em São Luís, fiquei hospedado por alguns dias na casa do meu conterrâneo e amigo de meus pais, dr. Merval de Oliveira Melo, na Rua do Apicum nº 72, no bairro do Apicum, não muito distante do centro da cidade.

Merval Melo, então deputado estadual, advogado, poeta, escritor e governador do Distrito L – 1 do Lions Clube Internacional, tratou de conseguir minha vaga no Liceu Maranhense, o que não foi difícil, devido eu ser procedente do Liceu Piauiense, além, é claro, das boas médias inseridas no meu Boletim Escolar.  Não precisei fazer o teste que era exigido à época.

 Quanto ao local da hospedagem, cogitou-se inicialmente uma vaga no Centro Guaxenduba, onde já residiam alguns amigos conterrâneos de Tutóia, entretanto, recebemos do então diretor, Padre Sydney Castelo Branco, resposta negativa, uma vez que àquela altura, próximo ao início das aulas, a lotação do Centro já estava completa.

Centro Guaxenduba é uma casa de estudantes localizada à rua de Nazaré, 58  ( Joaquim Távora)  em São Luís do Maranhão, que há mais de 50 anos abriga jovens oriundos das diversas cidades do interior do estado e também de outros estados que vão à capital maranhense com a finalidade de trabalhar e de estudar.

 Ao recebermos a resposta negativa do dirigente da instituição, saímos, eu e dr. Merval, a procura de outra hospedaria.

Cruzamos a avenida Pedro II em direção ao Palácio La Ravardièrie, adentramos em um pequeno beco até atingirmos a rua Graça Aranha na qual percorremos toda sua extensão, talvez uns quinhentos metros,  até atingirmos a Rua Luzia Burce, antigo Beco dos Barqueiros onde ainda  hoje existe o casarão de nº 52, local da minha primeira morada na capital gonçalvina.

Logo ao chegar dei de cara com uma pessoa que tinha morado em Tutóia e que era conhecido por todos nós como “o Antonio do Juiz” por ser cunhado de dr. Adonias Lucas de Lacerda que fora juiz de direito na minha cidade. Fiz amizade com todos, dentre eles o Francisco de Paula Daniel Maranhão, funcionário da Assembleia Legislativa, e como não poderia deixar de ser, assim como eu, era boêmio. Maranhão, como nós o chamávamos, por coincidência era irmão de José Ávila Daniel Maranhão que tinha sido agente previdenciário em Tutóia e gozava da estima e amizade de todos da cidade.

Muita gente famosa morou neste sobrado da rua Luzia Bruce, inclusive o acadêmico (Academia Maranhense de Letras) José Carlos Souza Silva, cadeira 33, muito antes de mim.

Tudo ia às mil maravilhas no famoso sobrado muitas vezes apelidado por nós mesmo de balança mais não cai, até que um dia chegou um casal do interior que iria passar alguns dias em São Luís. O seu Mundico o hospedou num quarto contíguo ao meu, uma vez que era o único que estava vago na pensão.

À noite, ao retornar do colégio, para refrescar tomei um banho de água friinha retirada do tanque (o local do banho era ao ar livre, tudo isso no primeiro andar), enrolei-me na toalha, voltei ao quarto, deitei-me em minha rede para finalmente tirar aquele ronco tranquilo, mas antes resolvi aliviar as tensões do dia com uma boa leitura de alguns capítulos do livro “A Última Promessa” de Bernardo Almeida.

Estava eu absorto em minha leitura quando de repente a energia elétrica faltou. Coisa  corriqueira em São Luís naqueles idos.

Da janela de meu quarto que dava para a rua Graça Aranha eu via a claridade da lua. Parece que era noite de lua cheia.  O clarão da lua favoreceu-me  não deixando meu quarto totalmente às escuras.

De repente ouço toc toc toc  na porta e uma voz suave e aveludada a dizer: ...meu bem... meu bem... sou eu amor!... abre a porta...

Meu Deus! Pensei eu. É a senhora do quarto vizinho! Deve ter ido ao banheiro e voltou atarentada. (Não tinham quartos com banheiros) O marido deve estar dormindo e ela confundiu-se com o quarto.

Vou orientá-la, pensei decidi abrir a porta e qual foi minha surpresa a deparar-me com um marmanjo bem mais alto do que eu,   fazendo sinal de silêncio com o dedo indicador sobre os lábios e falando baixinho:

— Shhh!... Ela está dormindo. Deixa eu entrar querido.  Estou morrendo de medo...

Surpreso, bati a porta e exclamei: — Sai pra lá carnaval! Comigo não violão!...


6 comentários:

  1. Meu amigo, que viagem no tempo. Lembro bem desse endereco e de sua passagem os lá. Apreciei muito o texto. Permita -me observar no trecho que fala da falta de energia. Acho que quis dizer ser corriqueiro
    a falta desse insumo,pois naquele tempo o dia em que não faltava pelo menos uma vez virava feriado kkk. Água, então, só sobrava na Fonte do Ribeirão. Bons tempos e parabéns.

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  2. Obrigado pela observação. Ao reler o texto agora pela manhã observei que necessito fazer pequenas correções, como essa por exemplo. Pena que o nobre amigo, ou amiga, não se identificou. Mas tudo m valeu.

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  3. Anthony Boden, amigo Gallas.julguei que meu nome estivesse no texto. Vou corrigir a falha. Anthony

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