quarta-feira, 17 de outubro de 2018

ARTIGO DA SEMANA

Cabra-cega.
Por Pádua Marques(*)



Tinha uma brincadeira no meu tempo de menino que ainda me lembro como se fosse hoje, a cabra-cega. Nunca esteve tão próxima e servindo de exemplo pra o que está acontecendo na política. Quem está acima dos 60 anos há de se lembrar que naquele tempo não existia televisão na Parnaíba e à noite as crianças ficavam brincando umas com as outras na porta da rua.
Cabra-cega era brincadeira de meninos e meninas. Começava com uns poucos, mas depois ninguém dava conta. Uma das meninas corria lá dentro de casa procurando um pedaço de pano, uma fralda, um pedaço de saia que fosse e na volta era escolhido aquele que daria a saída. O chefe da brincadeira dava umas rodadas pra ele ficar zonzo, tonto de onde estava. Fosse menino ou menina. Não tinha esse negócio não.
Cabra-cega. Não sei até hoje quem inventou, mas era brincadeira boa dos tempos dos meninos e meninas de meu tempo. Quem brincou nunca há de esquecer. E vinham mais depois outros e mais outros meninos das outras ruas. Vinham atraídos pelos gritos e risadas. Vinham suados, de calção e sem camisas, brigões, meninos feios, fogoiós e até os com cara de china. Vinham das redondezas, de outras brincadeiras de cowboys, de manchas, de pegar no rabo da raposa, do jogo de bola de meia.
E a gente ficava até a hora de se recolher pra dentro de casa nessas brincadeiras de pegar e soltar uns aos outros. Não havia saliência. Os meninos e meninas menores sempre eram os mais fáceis de serem capturados. Caiam na vez de sofrerem por um bom tempo até que passavam pra outros. Na escola era a mesma coisa. Brincadeiras de mancha. Esta agora sem os olhos cobertos por um pano. Valia a resistência.
Era brincadeira de astúcia. Consistia em descobrir e pegar o colega escondido. Sendo apanhado, era a hora de começar tudo, fazer tudo, usar de todas as formas pra sair do castigo. Outras brincadeiras do meu tempo de criança tinham as mesmas ou quase o mesmo jeito. Eram pra fazer a gente se sair, tentar passar essa dificuldade pro outro. Como é na política.
E a gente no final da noite antes de pegar o rumo de casa, havia mostrado o quanto era esperto e rápido em se livrar de armadilhas. Porque todas aquelas brincadeiras, fosse no meio da rua ou na escola à hora do recreio, tinham essa coisa de nos testar. Essa mesma agilidade que deve ser testada agora nessas eleições pra presidente. Estamos no meio de uma grande brincadeira de cabra-cega.
Só que desta vez são dois homens com panos nos olhos tentando nos pegar. Jair Bolsonaro e Fernando Haddad são as duas cabras-cegas. E os meninos e meninas se pondo a correr e se esconder pelos cantos e em cima dos muros e das cercas, por detrás dos carros estacionados na rua, na casa dos vizinhos e atrás uns dos outros. Ou somos nós as cabras-cegas?

Pádua Marques(*) Jornalista e Escritor. Ocupa a  cadeira 24 da Academia Parnaibana de Letras.

Um comentário:

  1. Caro Pádua, de acordo com o famoso "dr. google" aí está como surgiu a brincadeira da cabra-cega:"Uma das crianças, escolhida ou sorteada é a cabra-cega. Outra venda-lhes os olhos e a faz girar sobre si própria para a desnortear. As restantes saltam em volta dizendo: “Ó cabra-cega, ó cabra-cega!) ou batem-lhe nas costas e fogem para não serem agarradas. A cabra-cega orientando-se pelo som das vozes e virando-se rapidamente quando lhe tocam nas costas, procura pegar uma das outras crianças. Quando consegue tem então de a identificar, e a criança que foi pega passa a ser a cabra-cega.

    Cabra-cega é uma brincadeira de crianças surgida a mais de 2.000 anos atrás, na Grécia. A brincadeira é conhecida em toda a Europa: Itália, Mosca cieca (“mosca cega”); Alemanha, Blindekuh (“vaca cega”); e França, colin-maillard (chamada assim em uma espécie de homenagem a um homem chamado Colin que em um luta medieval, ficou cego). Nos Estados Unidos a brincadeira é conhecida como blindman’s buff. A cabra-cega é uma brincadeira extremamente comum em vários países ao redor do mundo.

    A brincadeira consiste em uma pessoa ser vendada e, em seguida, é girada várias vezes para ser desorientada. Os outros jogadores, que não estão com os olhos vendados, divertem-se se esquivando do “cego”, pois se a pessoa vendada tocar outra pessoa, a pessoa tocada será o “cego” da vez.

    Apesar de ser uma brincadeira infantil, em tempos antigos ela era muito popular entre os adultos. O diarista inglês Samuel Pepys relatou um jogo muito parecido com a cabra-cega jogado por sua esposa e alguns amigos em 1664. Em 1855 o poeta inglês Alfred, Lord Tennyson disse ter brincado de cabra cega".

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