quarta-feira, 25 de novembro de 2020

SHORT STORIES

  - non... maricon, non - 


Por Antonio Gallas

          Quando o presidente Jair Bolsonaro recentemente chamou o povo brasileiro de "maricas" um turbilhão de lembranças afloraram à minha memória. 

          Primeiro,  da minha infância e adolescência quando navios com bandeiras de diferentes  países atracavam no cais do Porto de Tutóia - MA para o embarque e desembarque de mercadorias transportadas por alvarengas puxadas pelos potentes rebocadores São Bento, Edmundo, Tamoio, Tamandaré  e outros pertencentes às companhias de navegação sediadas em Parnaíba - PI, como a Booth Line, por exemplo.

          Àquela época,  eram frequentes os  desentendimentos entre estivadores e "gringos",  como assim eram chamados os estrangeiros.  

          A palavra gringo,  já adicionada ao vocabulário da língua portuguesa  para designar indivíduo estrangeiro residente em,  ou de passagem pelo país,  surgiu  no século XIX  durante a guerra entre os Estados Unidos e o México,   e,   quem desejasse  ver um desses estrangeiros ofendido,  fulo da vida,  que o chamasse de maricon.

          Durante a guerra entre Estados Unidos e México,   quando  nos campos de batalha,  os soldados  americanos costumavam cantar a canção popular "green grows the lilacs" os lilás (rosas) crescem verde,  e quando  a ouviam,    os mexicanos bradavam: "a puestos porque allá vienen los gringos", que em português significa "preparem-se porque lá vêm os gringos"... 

Gringo é a junção da pronuncia de green grow. Daí a palavra atravessou os mares e chegou ao Brasil. 

           Mas voltando ao caso maricas,  adjetivo que qualifica o homem efeminado, homossexual,   o vocábulo  vem se modificando através dos tempos e recebe denominações próprias  dependendo de cada região.

          Aprendi ainda quando criança, que o homem que tinha atração por meninos era um pederastra. Depois, virou  viado, bicha,  baitola, qualira, traveco,  gay e assim vai... 

          Nosso presidente parece gostar do significado dessa palavra, pois de vez em quando nas suas entrevistas impetuosas e sem pensar lasca um desses seus sinônimos, como aconteceu    em recente  visita que fez   ao  Maranhão, e  ao saborear  o delicioso "sonho cor-de-rosa de todas as crianças" - assim era a propaganda do guaraná Jesus nas décadas de 1960 e 1970 -  Bolsonaro afirmou: "Agora virei boiola igual maranhense, é isso?" "É cor-de-rosa do Maranhão aí, ó!" Em seguida o presidente ainda referindo-se ao  refrigerante fala outras palavras,  quais, por respeito aos leitores não as publicarei, embora tenham sido citadas nos mais diferentes meios de comunicação do país, inclusive no jornal "O Globo".

          O  bar da minha tia Dalva Cerveira era parada obrigatória para quem desembarcava no Porto e Tutóia e apreciava tomar uma cerveja bem geladinha ou um refresco de Murici, fruta abundante nas várzeas do Salgado e no Mato do Cemitério.

          Localizado na Rua Senador Leite, a poucos metros do cais, contava com o bom atendimento  e a simpatia do casal Dalva e João Ambrósio, ele conferente de cargas e nas horas vagas barbeiro, que hoje chamam de cabeleireiro. 

          A cerveja, Brahma, Antarctica ou Malzebier,  era gelada em refrigeradores   Consul ou  Gelomatic alimentadas à base de querosene Jacaré,  pois naquela época, quando dava certo, a energia elétrica só estaria  disponível à noite, no horário  das 18 às 22 horas.



           O bar ficava a dois passos de onde as embarcações atracavam e por isso que era parada obrigatória para todos aqueles que desejavam refrescar-se do calor com uma loura suada, ou como já citei, com o saboroso refresco de murici preparado artesanalmente em peneiras-de talo-de-buriti uma vez que liquidificador, nem pensar... E ficava uma delícia!
          E foi exatamente  no bar da tia Dalva que tive oportunidade de presenciar  a um episódio que poderia ter sido trágico, caso não tivesse sido cômico. 

          Era quase final da tarde . Um gringo, tripulante de um navio estrangeiro ancorado no Porto  estava a deliciar-se com as geladas do bar da minha tia Dalva. Em sua companhia estava o parnaibano poliglota Souza Lima, interprete e funcionário da Botth, também um grande apreciador das geladas. 

          Apaixonado pela língua inglesa,  como sempre fui, estava eu a escutar o diálogo entre os dois,  tentando entender o que falavam, quando passa na rua, pela calçada do bar,  o cabo da Marinha,  Expedito Gonçalves,    e bem frente à  porta,  grita com aquela sua voz grave e bem alto: - maricooon!

          Ao ouvir o grito do Expedito, o estrangeiro que já estava meio zonzo, pois  havia deglutido umas tantas beers, levantou-se  bruscamente exclamando: "non, maricon non!" E ao tentar correr para alcançar seu desafeto, talvez para dar-lhe uns tabafes,  tropeçou em suas próprias pernas, indo estatelar-se de cara no chão. Foi socorrido pelo Souza Lima e por outras pessoas que estavam no bar.

À essa altura, o Expedito já estava lá no armazém do "seu" Dácio Neves, morrendo de rir, na companhia do Maneco Xeiroso,  Moacir Lima e Domingos Leal, funcionários da Capitania dos Portos.

Bebida exclusivamente maranhense

Nota do blog: as imagens são meramente ilustrativas.

3 comentários:

  1. Tempo bom.Lembro da geladeira a querozene e de um comentário do meu avo:"Como pode algo gelar com fogo?" Kkkkkk

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  2. Você me fez viajar nos bons tempos aqui vividos durante minha adolescência.
    Parabéns amigo 👏👏
    João Veloso - Tutóia - MA

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