sexta-feira, 19 de abril de 2019

SEMANA SANTA NA FAZENDA

Por: José Luiz de Carvalho(*)
 Semana Santa, (imaginem há 50 anos) era insuportável ter que comer só peixes, maxixada e bolo de puba.
Eu detestava tudo aquilo. Gostava mesmo era de uma espécie de torta feita de ovos batidos, trigo e sardinha (ou  de camarão).
Pela manhã bem cedinho, a molecada armada de canecas de alumínio sortidas com dois dedos de açúcar no fundo, partia para o curral. O vaqueiro Antônio Pereira já estava la, com a Branquinha e a Cara-preta e os seus mijolos (bezerros) devidamente amarrados para a ordenha do gostoso leite mugido. O farto e variado café seria servido depois das 8 horas, quando as mulheres se levantavam. Melhor mesmo eram os banhos no rio Pirangi, (bem no fundo do quintal).  A correnteza roncava sobre as pedras. Era um perigo! Eu, e outros pequenos ficávamos na parte mais rasa, só na inveja do Cândido, Laurindo, Chaguinha da Dedé, Aderson, Zé Gonçalo e outros rapazes que se divertiam à vontade, nadando e descendo as corredeiras. Isso só na sexta-feira depois do meio-dia (era pecado tomar banho nos “dias grandes”).
A casa da fazenda São Benedito ficava apertada para hospedar tanta gente; parentes, tanto do lado da mamãe como do papai, vinham de Buriti, Magalhães de Almeida e de Parnaíba. À noite todos reunidos na frente do casarão, sentados em cadeiras ou mesmo na calçada  tomando café com bolos diversos e ouvindo os mentirosos da região contando suas lendas e estórias de assombração. No sábado da Aleluia, tudo era liberado; o churrasco de porco ou de um gordo carneiro começava antes das 9 horas, quando “os cabras” começavam o comer a “papada de porco”,  com farinha de puba,  assada da trempe e regada a uma cachaça serrana. Na parte da tarde a brincadeira do pato(que enterrado no chão, ficava sujeito a cacetadas de um concorrente que desafiava a prova, com os olhos vendados. Pura e crueldade! E  a morte do Judas (feito de pano e com uma cabeça feita de tamburi) que estava pendurado entre duas carnaúbas, desde o início da semana.
Da nossa infância na fazenda, ainda somos capazes de sentir os cheiros e os sabores, num cenário mágico de rara beleza.
 


(*) José Luiz de Carvalho é poeta, escrior e presidente da Academia Parnaibana de Letras

 

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